sábado, 3 de agosto de 2013

Desenvolvimento da Música Brasileira - parte 2


Estilização da MPB
Numa tentativa de dar novo tom erudito ao estilo popular, que era vertiginosamente crescente no Brasil – a exemplo de todo o mundo --, a Crítica emancipou o termo Música Popular Brasileira (MPB) e estilizou seu padrão. Por questão subjetiva, as composições se adequavam à MPB na medida em que tivessem “bom nível”. Na prática, a classificação se dava mediante a aceitação ou não de um título pela alta sociedade (que sustentava o mercado de discos e espetáculos), independentemente da qualidade. Nesse jogo de marketing, muitos gênios e obras geniais se perderam. Os estilos e canções excluídos do círculo privado da elite eram chamados de “Brega”.
Esse conceito preconceituoso foi superado há muito. Os musicólogos hoje preferem definir a MPB como o escopo da música com propósito bem definido de ser “culta”. O restante é colocado na classificação de “música brasileira popular”.
A música estilizada teve o reforço de grandes nomes e um novo gênero: vide a seguir:

Bossa Nova
Um samba mais culto (na letra), mais cadenciado, mais preguiçoso e muito mais sofisticado (na instrumentação) é... é... É Bossa Nova! Foi o gênero que mais valorizou o violão – embora um dos seus fundadores fosse pianista. Essa autêntica criação brasileira teve inicio num disco gravado em 1959 pelo cantor, compositor e pianista carioca Antonio Carlos Jobim (1927 - 1994), um dos mais respeitados músicos brasileiros em todo o mundo. Esse nome faz parte da letra de “Desafinado”, um estrondoso sucesso, e assim ficou. Nesse mesmo ano veio a explosão internacional do gênero com o disco “Chega de saudade” de João Gilberto (1931 -), cantor, compositor e violonista baiano – sucesso de vendas no Brasil e em outros países, especialmente os Estados Unidos. O terceiro nome da “santíssima trindade da Bossa Nova” é o poeta carioca Vinícius de Moraes (1913 – 1980). Sozinho ou em parceiras (Tom Jobim, Toquinho, Edu Lobo, Baden Powell), ele compôs centenas de letras que seriam interpretadas por inúmeros artistas.


O sucesso nos EUA e a influencia que a Bossa Nova teve sobre a música americana, em especial o Jazz, fez com que seus principais artistas se transferissem pra lá. Lançada em 1956, “Garota de Ipanema”, de Tom e Vinícius é considerada a maior obra do gênero e uma das mais tocadas músicas no planeta ainda hoje. Em dueto com Frank Sinatra (1917 - 1998), Jobim gravou até uma versão dela em inglês com repercussão internacional.
Entre os instrumentistas, o que mais se notabilizou foi Baden Powell (1937 - 2000), violonista fluminense irrepreensível e internacionalmente reputado. A ala paulista fica bem representada com os nomes de: Paulinho Nogueira (1929 - 2002), célebre violonista, cantor e compositor; Toquinho (1946 -), discípulo de Paulinho Nogueira e parceiro de Vinícius de Moraes por 11 anos, da qual nasceram pérolas como “Aquarela”.
A principal investida dos precursores desse gênero foi na instrumentação -- por sinal, insuperável. Mas a Bossa Nova não seria a mesma sem as interpretações soberbas da gaúcha Elis Regina (1945 - 1982), considerada a melhor cantora brasileira e, por ser perfeita, insuperável. Além de belíssima voz e afinação, seu jeito de encenar a canção nos palcos era revolucionário. A parceria com o cantor paulista Jair Rodrigues (1939) num disco em 1964, rendeu aos dois um programa de televisão chamado “O fino da Bossa”.


As vozes dos Festivais
A força do som e imagem exercida pela televisão estabeleceu um novo padrão de comunicação musical, que abriu espaço para novos talentos em composição e interpretação: os festivais A antiga TV Excelsior lançou o “I Festival de Música Popular Brasileira” em 1965, realizado em Guarujá – SP. A canção premiada foi “Arrastão”, interpretada por Elis Regina e composta por Vinícius de Moraes e Edu Lobo (1943 -), um dos mais influentes compositores e arranjadores da segunda geração da MPB. A segunda colocada foi a canção “Valsa do amor que não vem”, também de Vinícius, em parceira com Baden Powell e cantada por Elizeth Cardoso (1918 - 1990), carioca chamada de “A divina”. Este evento teve uma enorme aceitação e deu novos rumos à música brasileira.
As edições seguintes variaram de nome e formato. A disputa acirrada dividia o público e certos resultados provocaram polemicas. Em 1966, o nome foi alterado para “Festival Nacional da Música Popular” para dar um ar menos elitista. O vencedor foi o paraibano Geraldo Vandré (1935 -), cantando “Porta-estandarte”, que compôs junto com Fernando Lona.


No mesmo ano, a TV Record resgatou o formato anterior e promoveu o “II Festival da Música Popular Brasileira”. O primeiro lugar ficou com “A banda”, de Chico Buarque (1944 -) que foi interpretada por ele e Nara Leão. O resultado foi fortemente contestado pelo público, que dava como certa a vitória de “Disparada”, composição da parceria Geraldo Vandré e Théo de Barros, interpretada por Jair Rodrigues – que ficou em segundo lugar.
A terceira edição foi considerada a melhor de todas pelo equilíbrio da disputa e imprevisibilidade do resultado. Marília Medalha (1944 -) e o Quarteto Novo cantaram “Ponteio” de Edu Lobo e Capinam e sagraram-se vencedores. Entre os novatos concorrentes estavam Caetano VelosoMilton Nascimento, Gilberto Gil e os Mutantes. Nas edições seguintes, as canções premiadas foram: 1968) “Meu amor” com autoria e interpretação de Tom Zé. 1967) “Sinal fechado” autoria e interpretação de Paulinho da Viola.
Paralelamente, no Rio de Janeiro ocorria o FIC, Festival Internacional da Canção, da TV Rio para a TV Globo, com edições anuais de 1966 a 1972. O mais relevante deles – exatamente por seu resultado ser considerado injusto --, foi o de 1968 em que a esmagadora maioria do público presente ao Maracanãzinho vaiou a premiação de “Sabiá”, cantada por Cynara & Cybele – apesar de os autores serem os respeitados: Tom Jobim e Chico Buarque. A preferência do povo estava sobre a que ficou em segundo lugar: “Para não dizer que não falei das flores”, mais lembrada como ”Caminhando e cantando”, escrita e cantada por Geraldo Vandré – escolhida como hino estudantil contra a ditadura militar. Essa decisão foi determinante para o desprestigio dos festivais.


No apagar das luzes os festivais serviram de palco aberto aos movimentos de anarquia contra a opressão política e social. Muitos artistas foram perseguidos, presos e até exilados. Assim se deu com Chico, Caetano e Gil. Por causa do hino estudantil, Geraldo Vandré foi preso, torturado e praticamente cego pelos militares.
Em lugar dos festivais, os programas de auditório exibidos por emissoras de televisão ganharam status, principalmente dois: “A Grande Chance”, apresentado por Flávio Cavalcanti (1923 - 1986) na extinta TV Tupi; e “Cassino do Chacrinha”, apresentado por Abelardo Barbosa (1917 - 1988) na Rede Globo.


Independentemente da premiação, muitos artistas se projetaram direto ou indiretamente a partir dos festivais. Tais como: Jorge Bem Jor, Gal Costa, Maria Bethânia, Beth Carvalho, Luiz Melodia, Belchior, Fagner, Zé Ramalho, Alceu Valença, etc.


Movimento Tropicalista
A resistência artística contra a ditadura militar que tomou o poder nacional em 1964 gerou o “Tropicalismo”, influenciado pelo Rockpop espalhado pelo mundo. Além do foco sócio-político, os tropicalistas se caracterizaram por ironizar e quebrar os padrões de comportamento impostos pela sociedade burguesa e preconceitos.
Sua origem no Brasil se deu nos anos derradeiros dos festivais de música popular e seu marco é considerado a canção de Caetano Veloso, denominada exatamente de “Tropicália”, lançada em 1968. As últimas edições dos próprios festivais eram indiretamente manifestações tropicalistas. Embora não houve um grupo formal, dizemos que os seguidores dessa tendência foram, além de Caetano, Gilberto Gil, Tom Zé, Os Mutantes (da qual fazia parte Rita Lee), Chico Buarque, Nara Leão e Gal Costa.

O Rei e A Guarda
Sem nenhuma pretensão que não a Música, Roberto Carlos Braga (1943 -) deixou Cachoeiro do Itapemirim, Espírito Santo, e foi parar na Rádio Nacional do Rio de Janeiro, onde foi descoberto pelo compositor e jornalista Carlos Imperial em 1958. Desde então coleciona anos e anos de glória profissional. Começou imitando a bossa de João Gilberto, mas logo em seguida trilhou o caminho do rock melódico disseminado pelo grupo inglês The Beatles. Passou a ser chamado de “Rei do iê-iê-iê”.


Em 1962, Roberto Carlos iniciou com Erasmo Carlos (1941 -) aquela que talvez seja a mais sólida e bem-sucedida parceria musical nacional. O primeiro disco da dupla (“Splish, splash”) estourou em todo o país e dominou as paradas dos rádios com várias músicas ao mesmo tempo (“Splish, splash”, “Parei na contramão” e “Terror dos namorados”). Eles são os criadores do movimento Jovem Guarda, caracterizado pelas roupas extravagantes, cabelos compridos e irreverência nas interpretações – um estilo inicialmente muito criticado, mas que em pouco tempo contagiou o Brasil. A cada ano, os discos de Roberto emplacavam vários sucessos, tais como: “Quero que você vá pro inferno”, “Eu te darei o céu”, “Os sete cabeludos”, “Quando”, “As curvas da estrada de Santos”.
Logo, muitos artistas e conjuntos musicais (como as bandas eram chamadas) se juntaram ao movimento. Destacaram-se: Wanderléia, Ed Wilson, Martinha, Sérgio Reis, Ronnie Von, Wanderley Cardoso, Jerry Adriani, Os Vips, Leno & Lílian, Reginaldo Rossi, Nilton César, Agnaldo Timóteo, Antonio Marcos, Renato & seus Blue Caps. Eduardo Araújo, e Os Incríveis.
Roberto Carlos mudou sua trajetória artística depois da década de 1970, pela sua aproximação à Igreja Católica – há quem diga que foi um conselho de um bom marqueteiro. Suas composições mais comportadas, românticas e intimistas. Essa guinada faliu a jovem guarda, mas sua performance pessoal só evoluía – sempre ao lado de Erasmo. “Detalhes”, “Como é grande o meu amor por você”, “Amada amante”, “Como vai você”, “De tanto amor” e “As canções que você fez pra mim” são alguns exemplos da imensa coleção de sucessos que o consagraram “O Rei”, o mais popular e maior recordista de discos do Brasil.
As versões de seus clássicos para o idioma inglês e principalmente o espanhol o tornaram um dos mais famosos cantores românticos do mundo. Já nessa segunda fase, a cada disco, pelo menos uma canção era dedicada à religiosidade
(como “Jesus Cristo”, “O Homem”, “Ele está pra chegar”, “Nossa Senhora”, “Apocalipse”, etc.) ou temas apelativos em favor da ecologia, fraternidade, combate às drogas e violência, etc. (exemplos: “As baleias”, “Amazônia”, “O careta”, etc.).

Música contemporânea
Paralelamente aos movimentos polarizados, a música nacional prosseguiu naturalmente. Tanto o samba, como a bossa, o sertanejo, o forró e demais estilos, continuaram a produzir incontestes sucessos e revelando talentos nacionais e regionais.


Apesar da censura dos militares, as vozes da MPB não paravam de produzir belas obras. O velho e o novo se misturavam e se renovavam seguidamente. Surgiram: Gonzaguinha (1945 - 1991), filho de Luís Gonzaga; João Bosco (1946 -); Ney Matogrosso (1941 -); Elza Soares; Novos Baianos (do qual participaram Baby Consuelo, Pepeu Gomes e Moraes Moreira), Clara Nunes, Geraldo Azevedo, Zé Geraldo, Elba ramalho, Ivan Lins, Djavan, Simone, Oswaldo Montenegro, Adriana Calcanhotto, Marisa Monte, Chico César, Ana Carolina, Jorge Vercilo, Maria Rita (filha de Elis Regina) e tantos outros ainda estão surgindo.
Do meio mais popular dizemos: Cauby Peixoto, Ângela Maria, Waldick Soriano, Diana, Odair José, Jane & Herondi, Paulo Sérgio e Amado Batista..
Da mesma forma, a música pop-romântica, embalada pelas novelas, brilhou sem parar com representantes como: The Fevers, Roupa Nova, 14 bis, Boca Livra, Tim Maia, Placa Luminosa, Fábio Jr., Yahoo, José Augusto, Rosana e Sandra de Sá.
Do samba de raiz podemos citar: Demônios da Garoa (Adoniran Barbosa), Martinho da Vila, Noite Ilustrada, Alcione, Zeca Pagodinho, Benito di Paula, Leci Brandão, Fundo de Quintal, Almir Guineto, Arlindo Cruz Jorge Aragão. Uma de suas ramificação: o pagode tem nomes como: Raça Negra, Só Pra Contrariar, Exaltasamba e Netinho de Paula.


O rock – bruto, pop ou mesclado (com reggae, tecno e swing) --, desde o espetacular Raul Seixas, também não parou de evoluir e gerar talentos: Cazuza (Barão Vermelho), Titãs, Os Paralamas do Sucesso, Rádio Táxi, Léo Jaime, Ultraje A Rigor, Capital Inicial, Biquíni Cavadão, Cidade Negra, Skank, Tribo de Jah, Renato Russo (Legião Urbana), Cássia ÉllerCharlie Brown Jr.
Também a música infantil brasileira tem histórico rico, sobretudo como suporte aos programas de televisão para esse segmento. Lembramos de Balão Mágico, Trem da Alegria, Mara Maravilha, Xuxa e Eliana.
O swing baiano marcou época a partir da década de 1980 com expressões tais como: Banda Reflexus. Banda Mel (Margareth Menezes), Chiclete com Banana, Banda Eva, Olodum, Netinho, Carlinhos Brown, Ricardo Chaves, Daniela Mercury, É o Tchan e Ivete Sangalo. Em seguida, veio a lambada de Beto Barbosa e Kaoma.


A música sertaneja deixou o campo e foi para o topo das paradas com: Chitãozinho & Xororó, Milionário & José Rico, Roberta Miranda, João Mineiro & Marciano, Chrystina & Ralf, Leandro & Leonardo, Zezé di Camargo & Luciano, Gian & Geovani, Rio Negro & Solimões e Bruno & Marrone.


Do altar para o rádio e televisão, o Pe. Marcelo Rossi reescreveu o modo de evangelização católica brasileira em 1999 com o CD mais vendido do ano. Bem ao estilo da “Renovação Carismática”, de teor espiritualista e louvor otimista, ele abriu um mercado promissor para outros católicos como Pe. Antonio Maria, Padre Zeca, além do já consagrado Pe. Zezinho. Este último, embora não seja muito lembrado pelo nome, é autor dos maiores clássicos cantados pela Igreja no Brasil, como: "Um Certo Galileu", “Estou pensando em Deus”, “Quando Jesus passar” e “Oração pela Família”. Na linha religiosa, a ala evangélica também ganhou bastante espaço e cravou nomes no cenário nacional. Alguns deles: Aline BarrosJota Neto, além de artistas populares convertidos, como Mara Maravilha, Dalvan e Nelson Ned.


Novos ritmos são criados e outros remodelados. É o caso do forró clássico que sofreu em pouco tempo, duas grandes transformações. Na primeira, na década de 1990, ele foi eletrificado e sofisticado por grandes bandas como: Mastruz com Leite (a pioneira dessa safra) e a Banda Magníficos de Monteiro – PB, sintetizado pelos tecladistas iniciados por Frank Aguiar. Na segunda transformação, iniciada em 1999, ele voltou às origens com o estilo “Pé-de-serra”’, também chamado de “Universitário”. Seus ícones são Falamansa, Bicho de Pé, Rastapé, Trio Forrozão e Trio Virgulino.
O brega virou chique com a Banda Calypso de Belém do Pará, que misturou batidas caribenhas com o folclore nortista e virou febre nacional no começo deste milênio.
É muito provável que tenha sentido a ausência de um ou mais nomes de artistas, bandas ou estilos e movimentos a este resumo histórico. Isso porque é realmente impossível descrever a gigantesca e qualificada obra musical brasileira, que é, sem sombra de dúvidas, digna de reconhecimento, a começar pelo seu principal atributo: a diversidade.

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